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Da vida de Pi

Da vida de Pi... nilla. Vivo de ler e escrever. De ler escritas, de escrever leituras, de debater termos e criar frases. Aqui escrevo da vidinha. Vidinha de Pi, é isso.

Da vida de Pi

Da vida de Pi... nilla. Vivo de ler e escrever. De ler escritas, de escrever leituras, de debater termos e criar frases. Aqui escrevo da vidinha. Vidinha de Pi, é isso.

Hoje é dia de Carlota

Pi, 29.01.15
Falemos a correr do último ano e meio, do primeiro impacto, da notícias, das mensagens da mãe que chegaram como uma bola de neve: "tem líquido no cérebro", "hidrocefalia", "um tumor, vai ser operada". Das operações e recuperações, do síndrome, da corrida do peso contra o tempo, das quimios, dos descansos, dos vómitos alternados com boas semanas a comer que eram quando uma sopa e fruta ficavam. E o peso nada. E a visão, que permanece num silêncio esperançoso que todos calamos mas desejamos. 
De junho para cá tudo diferente. Mais peso, mais força, e uma evolução enorme em tudo. Sentar e interagir podem ser grandes vitórias, e a Carlota tem vencido sempre. Há tropeções, mas perto de tudo são migalhas e a Carlota avança sempre. Não falemos dos tropeções, estamos entre acontecimentos, exames e análises e é tempo de respirar fundo.
Falemos antes de como é ver agora a Carlota sentada a brincar, rechonchudinha, finalmente com mãozinha de furos. De como vai falando à sua maneira e aponta para si quando se pergunta "onde está a Carlota?", como em pouco tempo sabe indicar boca, nariz e orelhinhas. Pode não parecer muito mas quem lhe é próximo sabe o importante que é vê-la crescer agora já mais dentro do que é suposto. 
Não falemos mais. Por hoje comemoremos os 2 anos que a Carlota faz. Comemoremos, como diz a mãe, pelos dois anos, que o ano passado dia 29 de Janeiro era dia de recuperação de uma operação muito importante. Mas deixemos a parte médica por hoje. 
 
Parabéns "Calota mia". ♥

 

Carlota2.jpg

 

American Sniper. Acho que sem spoilers

Pi, 28.01.15
Em pequena era sempre pelos índios, hoje - não que tenha crescido muito - sou sempre pelos marines. Mas só se não houver seals, aí sou dos seals desde pequenina. Óbvio. Sou assim, uma redneck de trazer por casa mas assumida. E não, isto não se transporta para o dia-a-dia, para a Faixa de Gaza e mais não sei quê. Isto é Hollywood, e Hollywood a mim vende muito bem Seals e Marines. Sem problema.

Façam um favor a vocês mesmos e não vão ver o American Sniper à procura do bebé que não o é. Se há alguma coisa para que guerras servem é para dar filmaços de guerra, e o super Clint não merece que se lhe destrua a obra com um "ah, é um boneco, vi logo". É um boneco, e também acho pena que seja, mas o filme é bem mais que isso.

Chris Kyle é real e bem recente. Se é espectacular enaltecer um sniper? Se calhar não (vá, é um bocadinho, diz a seal em mim. BOOYAH!), aceito que seja discutível, mas estes filmes -  ver Black Hawk Down, Jarhead, Hurt Locker, In the Valley of ElahBrothers, Zero Dark Thirty e certamente esqueço-me de alguns - também servem para ver o estado daquelas cabeças em cenário de guerra e fora dele, de miudos e homens nossos contemporâneos. É aqui e agora que vivem. E mais, claro, cada um retirará o que quiser. Adiante. 

American Sniper pode não ser um "Hurt Locker"  mas dá para eu obcecar uns dias com Chris Kyle. 

 

(e tem o Bradley Cooper. Um filme com o Bradley Cooper é sempre melhor que um filme sem o Bradley Cooper. É científico.)

Senti-me desenhada no metro

Pi, 27.01.15
Numa das curtas viagens de metro, sentei-me à frente de uma miúda na qual reparei por ter uma boina digna do Oliver Twist.  Pareceu-me que vinha a estudar, mas pouco tempo. Quando voltei a olhar para ela, achei que desenhava. Que me desenhava. Olhava para mim e rabiscava, tudo muito rapidamente. Tive vontade de perguntar ao homem ao seu lado "sou eu? Que tal está a ficar?"  mas na verdade nunca faço isso, deixei-me estar.  Conheço quem já tenha sido chamado à atenção por tentar tirar fotografias a pessoas no metro, e dei comigo a pensar se é muito diferente. Ainda não cheguei a nenhuma conclusão.  E foi isto, acho que estou num bloco de alguém, rascunhada à pressa entre três paragens. Só acho, não vi nem verei. Podia dizer que é essa a magia do metro, mas isso seria um bocadinho deprimente.  Fico a pensar que rabiscos terão saído dali. Sou cinco riscos? Muitos de uma só vez? Chego a parecer eu? Talvez tenha resultado num Picasso e a esta hora a minha melena é um triângulo sobre um quadrado inclinado, com um olho no topo e o outro sabe-se lá onde. 

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Aqueles casacos de bicho

Pi, 21.01.15
Sabeis? De tigre, leopardinho, girafa, zebra e assim. Até orelhinhas têm. Esses, sim. Acho-os uma graça, mas não me vejo usar um, só se for o de urso pardo: escuro e liso. Animal print sim, animal print com orelhinhas ainda não sei. Acho que nem é pelas orelhas, todos os que vejo parecem demasiado ursinho carinhoso e não tanto animais selvagens. A rever. Mas não era isso que queria dizer.  Esta manhã, no comboio, vinha uma miúda com um desses casacos. Tudo Ok, age appropriate, na moda e tal, até vinha de carapuço posto - o que se percebe, além de estar frio, como mostrar as orelhas se não for assim? You go girl! - e tudo. Pequeno detalhe: discutia com alguém ao telefone. E quando se discute com alguém de orelhas de bicho sarapintado, acreditem, é melhor que seja só telefone, porque de outra forma ninguém nos leva a sério. 

Enviado de Samsung Mobile

IPO. Pediatria. Falemos disto (agora já) sem medos

Pi, 15.01.15

DrsPalhaços.png

Eu - como tanta gente - pensei muitas vezes o que seria a pediatria num sitio como o IPO. Todos queremos distância de tal sítio - do IPO todo, não só da pediatria - por todos os motivos e mais algum, se a pudermos ter. Nunca tinha lá entrado, nunca tive de lá ir. 

Ouvi muitas vezes e provavelmente também o terei dito que a ala pediátrica devia ser dura, que voluntariado simmas ali não. Falamos muito, nós. 

O ano passado dei comigo a ir ao IPO com uma criança de pouco mais de um ano, a Carlota. Acompanhei dias de análises, consultas e exames e várias horas de espera de resultados, quer no Hospital de Dia quer no piso do Serviço de Pediatria. Vi crianças em tratamento, umas pacientemente à espera do fim, outras mais agitadas. Vi pais mais resistentes que outros, vi pais permitirem-se um desabafo lá fora para aguentar mais um pouco junto dos filhos. 

Testemunhei como o pessoal é dedicado e orientado para as crianças, vi os doutores palhaços acocorados cantar para a Carlota enquanto ela comia e não sabiamos se a sopa ía ficar ou voar no minuto a seguir. Não é um mundo de que se queira fazer parte, mas estando lá as coisas são feitas para que seja o nosso mundinho enquanto for necessário. E bem. E é.

Não, nunca me "fez impressão", no dia em que entrei pela primeira vez no Hospital de Dia o drama da minha cabeça foi-se. Não por não ser dramático o que lá se passa, naturalmente que é, mas o meu drama e o de tanta gente estava deslocado, não era por ali.

Vi muitas crianças, muitas. Uma que fosse já era demais, mas vi várias. E foi ao ver estas crianças que percebi como quando dizemos que não eramos capazes não podiamos estar mais longe da verdade. Eu acredito que muita gente não fosse capaz de ali estar, respeito a resistencia de cada um. Mas passa-se a porta e não é sobre nós, passa a ser sobre eles. Comigo foi automático, sem esforço. Entrei e ali contavam só aquelas crianças, eu não, não as impressões, não os dramas de conversas ditas sem saber na pele sobre as coisas. Eu poderia eventualmente ajudar no que pudesse e não atrapalhar. A Carlota e os outros meninos é que importavam ali dentro.

Outra coisa de que as pessoas têm receio é de ver crianças em sofrimento. É claro que haverá níveis e casos para tudo, é claro que em pediatria há pré-adolescentes e é bem diferente com eles, sentem tudo de outra forma e torna-se mais duro nesses casos, admito. Mas muitas das crianças que vi temiam as "picas"- viam um enfermeiro e de beicinho queixavam-se "não... tu dás pica" (e o meu coração desfazia-se mais um bocadinho) ou de tirar adesivos, do repelão na pele. Isto comoveu-me de uma maneira que não sei explicar, problemas tão piores as levavam ali mas os medos delas são muitas vezes estes. A verdadeira e mais pura inocência. A mesmo inocência que as faz pedir aos pais para irem mais cedo e poderem ir brincar no Lions antes das análises, exames e tratamentos. 

O meu fantasma de fazer voluntariado num lugar assim foi-se. Não seria fácil, não tenho essa ilusão, mas hoje sei que teria a força que um dia achei não ter. Eles não choram o que lhes aconteceu, quem sou eu para me sentir fraca perante isso?

Gosto de ouvir música enquanto trabalho

Pi, 13.01.15

mas se tenho de ler prefiro que não haja letra. Manias. Por isso quando há leituras e pesquisas a fazer, recorro aos clássicos.

Hoje, Brahms no Spotify. E eis senão quando soa isto:

brahms.png

 

E eu, que palavrinhadonra sou tão distraída e esquecida para umas coisas e tenho tanta memória para outras, só me lembro de Queijinhos Frescos:

♫ A Raqueeeeel lê banda desenhadaaa tooooodos os dias, horasemfim! Dos seeeeus heróis conheçuuuuus segredooos... ♫
 
Lá se foi o plano infalível. E é isto a minha vida. 

 

Na ressaca dos Charlies

Pi, 09.01.15
Ontem o drama, a confusão eram com o humor. Nada de novo nas redes sociais, basta morrer alguém e haver uma piada para se levantar mais uma vez a discussão dos limites.  Não há limites no humor, o limite é o de cada um de nós que o recebe e gosta ou não. E quem o faz saberá até onde quer ir seja lá por que motivo for.  Mas esta conversa ainda tem alguma elevação e o que se tem lido não tem tanta. Vejamos.  O verdadeiro drama, esse sim, que aconteceu esta semana está ligado à uma publicação satírica, a pessoas que viviam do humor. Vêem-se bastonários da liberdade de expressão em cada cantinho da Internet. E por mim, tudo bem embora desconfie que sejam os mesmos que estão de dedinho virtual apontado em ocasiões mais nacionais digamos. Se se ousa fazer humor com o assunto viram lápis azul, que falta de respeito, o Charlie é que te deu a liberdade que tens hoje, se podes falar assim à caricatura do Bin Laden ou Moisés ou lá que é o deves.  E fica-se a pensar afinal que volta é que isto dá e onde se perde o humor no meio deste drama, e ainda como é fascinante que transponham o discurso do 25 de Abril para Charlie Hebdo. As pessoas têm mesmo uma gavetinha de chavões - um folder, as mais modernas - prontos a usar em cada assunto.  Uma coisa não tem a ver com a outra, perceba-se isso de uma vez. Porque alguém pergunta "hoje ainda somos Charlie?" não deixou de achar um horror e repudiar o que aconteceu. Por dizerem "eu cá nunca disse que era Charlie" não têm mais estilo que os outros, é indiferente que o tenham escrito, importa mais que o sejam todos os dias.  Importava também e mesmo que se percebesse que uns desenhos (desenhos, pá!) e humor acabaram num banho de sangue. E o comentário a fazer não é "puseram-se a jeito..." ou "se fosse o teu profeta queria ver...". Não. A questão é muito básica: não se mata.  Um dia podíamos fazer um exercício todos juntos: raciocinar. 

Enviado de Samsung Mobile

Ser Charlie hoje. E amanhã.

Pi, 08.01.15

Ontem fomos todos Charlie, hoje ainda somos todos Charlie, amanhã talvez menos, depois menos e assim sucessivamente. Sem censura nem problema, somos assim e não nos vamos esquecer disto nunca, tenho essa certeza, digamos ou não que somos Charlie. 

Dizia, fomos todos Charlie, escolhemos ver ou não as imagens brutais do ataque. 

Lemos o Gustavo Santos e optámos por falar ou não sobre a tontice do Gustavo. 

Escolhemos, fomos livres de ver, criticar, gritar e espernear. E somos. Porque somos Charlie e não é de ontem. 

Ao fim do dia os censores de serviço eram muitos. Dos que não queriam ter o vídeo à frente do nariz aos que não acreditavam que houvesse quem não tivesse emitido uma palavra sobre o assunto o dia todo. Só não cheguei a ler "já chega de Charlie Hebdo", mas pode ter sido só distracção minha, é a afirmação clássica em dias dominados por um só assunto, seja qual for, nas redes sociais. 

Portanto, não gostamos do que pensam os Gustavos Santos mas queremos que toda a gente fale. E quantos mais Gustavos haverá? Muitos, não duvido. Por mim, tudo bem, todos temos direito a expressar-nos. Como a estar calados, se assim o quisermos. As pessoas cansam-me, no fundo é isso. 

E não vejo isto como Islão contra Ocidente, e mesmo a liberdade de expressão me custa que seja o estandarte para uma coisa tão triste e animalesca. Se as caricaturas foram o motivo, é estúpido. Se são uma desculpa para alimentar ódios, começar guerras, lançar a extrema direita, o que queiram, ainda é mais cretino. Isto foi uma atitude hedionda de umas bestas, sejam quem forem e quantas forem. Células de bestas, se quiserem. E massacres, entradas em edifícios para matar gente não são coisa estranha ao Ocidente, convenhamos. Portanto não me venham com o Islão inteiro que eu também não admito que me julguem por um Breivik. 

O que eu sei, o que para mim hoje está a valer, é que aqueles grandes queridos que andaram aos tiros em Paris para calar caricaturas, conseguiram que hoje as houvesse por todo o mundo nas primeiras páginas dos jornais. Maior espalhafato não era possível. Ainda bem. 

Enviado de Samsung Mobile

Ser ou não ser. Distraída, pois!

Pi, 05.01.15

Então eu hoje - valha-me Deus - não tenho Shakespearada das antigas - e eu quero tanto saber e ver, senhores - e estava, para não variar, completa, total e dessincronizadamente na lua?

Eu - ai eu - quando estive em Londres gostei tanto do Shakespeare's Globe, mas não cheguei a ver lá nada, e agora quero tanto ver e tinha-me passado. Assim. De um dia para o outro.  

Mamãe ligou a lembrar. É que nem disfarcei. Falou-se nisto ainda a semana passada, mas os fins de semana acabam, as segundas começam, arranjam-se estas desculpas, e uma pessoa esquece-se. Eu, sou eu que me esqueço, comecemos o ano a assumir estas coisas. 

Eu faço destas mais vezes, muitas mais do que gostaria. Esquecer-me, trocar datas ou lugares. Felizmente tudo tem tido solução antes de ser precisa a emenda. Pior é mesmo quando marco duas coisas para o mesmo dia, aí é que é o fim da picada. Já não acontece há algum tempo, tentarei que não se passe mais. 

Com isto não estou nada vestida para o teatro. A ver se improviso uma gola de Camões ali com folhas da Xerox.