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Da vida de Pi

Da vida de Pi... nilla. Vivo de ler e escrever. De ler escritas, de escrever leituras, de debater termos e criar frases. Aqui escrevo da vidinha. Vidinha de Pi, é isso.

Da vida de Pi

Da vida de Pi... nilla. Vivo de ler e escrever. De ler escritas, de escrever leituras, de debater termos e criar frases. Aqui escrevo da vidinha. Vidinha de Pi, é isso.

"O Retorno" - Dulce Maria Cardoso

Pi, 16.01.24

 

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1975, Luanda. A descolonização instiga ódios e guerras. Os brancos debandam e em poucos meses chegam a Portugal mais de meio milhão de pessoas. O processo revolucionário está no seu auge e os retornados são recebidos com desconfiança e hostilidade. Muitos nao têm para onde ir nem do que viver. Rui tem quinze anos e é um deles. 1975. Lisboa. Durante mais de um ano, Rui e a família vivem num quarto de um hotel de 5 estrelas a abarrotar de retornados — um improvável purgatório sem salvação garantida que se degrada de dia para dia. A adolescência torna-se uma espera assustada pela idade adulta: aprender o desespero e a raiva, reaprender o amor, inventar a esperança. África sempre presente mas cada vez mais longe.

Comecei a ler Dulce Maria Cardoso,  pel' "Os meus sentimentos", que cá hei-de deixar também. Mas é "O Retorno" que me traz desta vez.
"O Retorno", pela voz de Rui, um rapaz de 15 anos, fala-nos da vinda para Portugal de famílias que viviam nas colónias portuguesas em África. Numa só voz, a de Rui, conseguimos perceber a experiência de diversas personagens, de diferentes idades e vivências até então. A vida em Lisboa não é fácil para ninguém. Saber como foi a vida de quem veio de África, contra sua vontade, contra toda a expectativa que a vida prometia.

Toda a vida conheci quem tivesse pais vindos de lá, quem lá tivesse nascido. Sempre conheci o termo "retornado", vivi não muito longe de um dos hoteis que os acolheu. Mas tirando uma ideia generalizada de que eram pessoas com um espírito mais leve, que ía ouvindo, sabia muito pouco sobre estes regressos, este retorno. Agora sei que sabia nada.

Em pinceladas, sem impingir ou evangelizar, Dulce Maria Cardoso faz chegar-nos uma descrição do dia a dia destes portugueses, o impacto nos, e dos, que cá estavam. Mentalidades da altura, experiências de vidas antigas, personagens memoráveis (como o castiço Pacaça, "o retornado mais retornado do hotel"). Gostei sobretudo de me sentir transportada àquele hotel, àquela Lisboa fria, aos contentores no porto, espreitar hábitos e formas de pensar - "um homem que me ensinou a respeitar toda a gente" -, perceber a cisão entre quem veio e quem estava - "um dos retornados que responda, o retornado da carteira do fundo que responda".

São muito evidentes (actuais até) os rótulos e ideias feitas de parte a parte, o tratamento condescendente de quem sempre se achou certo, mas nunca saiu do lugar. Não sei se mudámos muito.

 

Imagina...

Pi, 08.01.24

Dou por mim muitas vezes a descrever uma ideia, uma imagem começando com "Imagina", como "mas, imagina, se for assim ou assado". Este "imagina" que dizemos antes de começar uma frase - quer dizer, eu digo, mais alguém? Ouço-o por todo o lado, de há uns tempos para cá.

Não gosto muito de ter bengalas na linguagem, mas de vez em quando lá aparecem, agarram-se-me ao discurso e ficam uns tempos. "Imagina", antes de explicar alguma coisa, ou a meio de uma ideia, tem sido a mais flagrante dos últimos tempos. Mas também me faz pensar como não a usávamos antes, ou mais vezes. O que diríamos antes deste "imagina"? Talvez fosse o "por exemplo", ou "imaginemos".

Do que eu não gosto é de dar por mim a dizer constantemente "imagina", "mas, imagina...", canso-me de me ouvir. Nem é das piores expressões, repetições exaustivas à parte. Pedir a alguém que imagine devia ser sempre uma coisa boa, embora este que digo não tenha só esse sentido. É muitas vezes uma vírgula, uma mudança de direcção quase, outras substitui um "repara".

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Por outro lado, lembra-me o "Picture it!" da saudosa Sophia Petrillo, de "Golden Girls" ("Sarilhos com Elas" por cá) e eu não tenho nada contra ser Sophia Petrillo. Porque, imagina, tu que me lês até aqui, a Sophia tinha sempre a melhor punchline da série.

Imagino que me habite o discurso por mais um tempo, há coisas piores.

Ano Novo, Bom Ano!

Pi, 03.01.24

Assustam-me resoluções e pontos finais, ainda não domino começos determinados e devia. Tenho ideias, planos a concretizar, mas o passo em frente demora sempre. Por isso o início do ano não costuma ser de vida totalmente nova para mim. Começa o ano e é fácil ter uma sensação de recomeço e renovação. Mas é sempre preciso tomar uma atitude, avançar para o novo objectivo. 

Também sou da escola que vê resoluções como pressão, imposições mesmo que a nós próprios, que feitas só porque sim não me fazem sentido. As resoluções são muitas vezes coisas que devíamos estar a fazer, gostávamos de já ter feito, aproveitamos este empurrão do novo ano, nova página (outro cliché da época), para avançar.

Sou eu, não és tu, resolução.

Agora vou ali ver se dou mais uns passos em planos com algum tempo.